Spray nasal será reforço fundamental das vacinas aplicadas por via intramuscular
Um recente estudo, desenvolvido pela Unifesp, apresenta uma nova geração de imunizantes capaz de frear a transmissão do coronavírus. O veículo utilizado será um spray nasal, que, ao atingir a mucosa, estimula a produção dos anticorpos tipo IgA, ideais para combater doenças respiratórias.
As vacinas aplicadas no músculo estimulam a produção de anticorpos dos tipos IgM e IgG, que circulam livremente no sangue e no plasma, mas podem não ser capazes de frear a transmissão do vírus. A novidade é que, as conhecidas vacinas de segunda geração estimulam o local exato onde o vírus inicia a sua “invasão”.
Para entender melhor o assunto, o infectologista Celso Granato, médico, professor adjunto aposentado da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e diretor clínico do Grupo Fleury fala mais sobre o tema.
Confira na íntegra a entrevista concedida à essa instituição:
A impressão que temos é que os testes para Covid-19 foram muito mais bem aceitos do que as vacinas. Como você percebe isso?
C.G. Você aceitar fazer um teste é, de certa forma, uma manifestação de curiosidade, principalmente porque os sintomas são parecidos com os de outras doenças. A manifestação da Covid-19 é muito vasta, e varia de diarreia a insuficiência respiratória. Considerando que cerca de 35% dos infectados são assintomáticos, é natural que isso gere preocupação na sociedade. Mas de maneira geral, o brasileiro adora tomar vacina. É de graça, muitos encaram até como um dia especial.
Há um argumento comum entre os grupos que se opõe às vacinas – que foram criadas “muito depressa”. Muitos preferem esperar esses imunizantes serem aperfeiçoados, como aconteceu com a vacina contra o H1N1, que hoje de fato provoca menos reações adversas.
C.G. Um dos primeiros trabalhos sobre a efetividade da vacina contra os Sars-CoV foi publicado em 2003! Outro, em meados de 2005. Esses mesmos grupos que saíram na frente da vacinação, especialmente a China (Sinovac) e a Inglaterra (Universidade de Oxford) estavam trabalhando por causa do Sars-CoV-1. Sabe quantos trabalhos foram publicados entre 2002 e 2019 sobre Sars-CoV? 128 trabalhos sobre vacinas, numa época em que nem sabíamos da existência do Sars-CoV-2. Parece que temos vacinas fabricadas há pouco tempo, mas já faz mais de 18 anos que o primeiro Sars-CoV começou a ser pesquisado.
A confiança na ciência mudou ao longo do tempo? Tomo como base a última pandemia, há 100 anos, de gripe espanhola.
O grande diferencial foi a evolução da ciência. Para dizer a verdade, tivemos uma sorte imensa com a gripe de 1918, pois ela se extinguiu praticamente sozinha. Teve uma ou outra medida da época que adotamos com a pandemia de Covid-19, como o uso de máscara. Mas o que mudou nesses 100 anos não é brincadeira. Só para citar alguns marcos, antes não fazíamos cultura de células para estudar vírus e bactérias, um procedimento que surgiu somente na década de 1930 e trouxe a vacina da febre amarela. Até hoje, esse princípio é usado para fabricar outras vacinas, como a da gripe. Nessa época, também não existia microscópio eletrônico, somente o microscópio comum, e por isso não conseguíamos enxergar os vírus. Com essa inovação, veio a biologia molecular, que surgiu em grande medida nos anos 1950 e avançou muito com o aparecimento do HIV. Imagine hoje, pegamos uma coisinha que não enxergamos a olho nu, cortamos só um pedacinho que produz uma proteína, injetamos no paciente e, com isso, ele pode produzir anticorpos e ficar protegido contra várias doenças.
Sendo tecnologias recentes, não geraram na época a mesma desconfiança da população que presenciamos hoje?
C.G. A vacina da gripe surgiu nos anos 1960 e a tecnologia para sua produção não mudou muito. E existem muitas outras doenças que continuarão sendo combatidas do mesmo jeito. Existe um vírus que ataca crianças pequenas chamado vírus sincicial respiratório (VSR), que provoca uma síndrome respiratória que pode levar à internação e à morte. Garanto para você que, quando começarmos a aplicar as tecnologias incorporadas com a Covid-19 no combate a essa doença, logo surge uma vacina que, em outros tempos, não conseguimos desenvolver. A beleza da ciência é que a gente “apanha” muito mas, na hora que abaixa a poeira, a gente vê que o conhecimento pode ser utilizado no combate a outras doenças.
Isso faz a gente refletir também sobre as doenças que ainda não têm cura e a nossa capacidade “evolutiva” de se adaptar aos novos patógenos. Estamos prontos para esse risco e colocar as vacinas de lado?
C.G. A gente tem aprendido que existem características genéticas que tornam algumas pessoas mais suscetíveis do que outras. Contudo, são processos muito mais lentos na natureza. Certamente, quem sobreviveu a essa pandemia vai passar essa imunidade para as próximas gerações, e aparecerão pessoas naturalmente mais resistentes ao coronavírus. Em curto prazo, não é indicado arriscar. Quando temos um “jump”, um pulo interespécie de um vírus, é sempre complexo. Isso aconteceu com o HIV, quando passou do macaco para o ser humano, com o ebola e o Sars-CoV-2. Quando um vírus passa de uma espécie a outra, um trajeto não muito fácil do ponto de vista biológico, ele tem que se adaptar ao novo hospedeiro. Essa adaptação, via de regra, provoca doenças graves. Para o vírus, isso é péssimo, pois se ele mata o hospedeiro, tão logo não tem nenhum hospedeiro para ele. Aí ele tem que mudar para outra espécie. Ao longo do tempo, temos que continuar vacinando até “estabilizar” o vírus.
E quanto às mascaras e às previsões sobre as novas epidemias previstas por aí?
C.G. Acho que a gente não deveria deixar de usar máscara em curto prazo, bem como devemos continuar a tomar todas as precauções que temos tomado até aqui e nos vacinar seguindo as orientações dos órgãos de saúde pública. Isso porque as vacinas atuais ainda não conseguiram eliminar a transmissão do vírus, somente diminuir número de casos, internações e óbitos. É possível que isso venha com vacinas mais específicas, de segunda geração, como as de spray nasal. Esse tipo de imunização ainda não é comum no Brasil, é mais cara, mas é comum nos Estados Unidos, por exemplo. Os anticorpos que nós produzimos são mais ou menos “locais”. Se damos uma vacina intramuscular, como no caso da Covid-19, são produzidos muitos anticorpos no sangue, mas faz muito poucos anticorpos no nariz. Mas uma vacina nasal estimula a produção de anticorpos nessa região. Um bom exemplo é, novamente, a poliomielite. Qual a diferença da vacina Sabin da vacina Salk? A Salk é intramuscular, que não interfere na multiplicação do vírus pois ele entra pela boca. A grande sacada da vacina Sabin foi fazer uma vacina que é ministrada na boca, porta de entrada do vírus. Ganhou o Nobel por conta disso e salvou a vida de milhões de pessoas. Com vacinas de spray, a transmissão pode definitivamente cessar.
O que leva nosso organismo a produzir anticorpos localmente? A circulação dos anticorpos não é homogênea no corpo humano?
C.G. Os locais mais expostos para patógenos são nariz, boca e olhos. O que a natureza fez, então? Criou mecanismos de defesa nessas portas de entrada. Com isso, temos anticorpos de mucosa específicos que não são encontrados no sangue. A hepatite é transmitida pelo sangue, e a vacina intramuscular é altamente eficiente para combater essa doença. Mas para a hepatite A, não funciona tão bem. Tecnicamente, temos os anticorpos IgG e os do tipo IgA (anticorpo produzido nas mucosas), e a distribuição desses anticorpos é feita de forma inteligente pelo nosso organismo a depender da doença que irão combater. A natureza é fantástica!
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